sábado, 20 de junho de 2009

A Lição da Montanha

“Passeavam na montanha, um velho monge tibetano e seu discípulo quando avistaram em meio a neve um filhote de passarinho. O monge apanhou em suas mãos o filhote paralisado de frio, entre a vida e a morte e o acalentou junto ao peito. O jovem discípulo sentiu em seu coração o calor do amor do velho monge, como se, fosse ele próprio o filhote. O velho então avistou próximo ao caminho, um monte de estrume, recém defecado por um boi que pastava naquela áreas. A fim de que prosseguissem sua jornada, ele aninhou o passarinho no estrume, que sentindo o calor a sua volta, passou a piar com efusiva alegria. Mais alegre ficou ainda o discípulo, vendo que o venerável mestre havia salvado a vida do filhote, respeitando mesmo as menores criaturas, como mandam os ensinos orientais. Eis que então surge do alto, alertado pelo feliz piado do filhote, um veloz gavião. O gavião mergulha por sobre o esterco e em um só golpe leva o passarinho em suas garras.

- Oh!Mestre, quanta injustiça ! Disse o discípulo em meio às lágrimas.

O Monge então falou, do alto de sua bem-humorada sabedoria, como competem aos mestres do oriente:

- Devemos tirar do episódio não uma, mas três importantes lições!

- E qual seriam, venerável mestre?Disse o discípulo, enquanto enxugava as lágrimas nas mangas de seu hábito.

- Primeiro: - Nem sempre quem te põe na merda, é seu inimigo!

-Segundo: - Nem sempre quem te tira da merda, é seu amigo!

- E, terceiro: - Se estiver na merda, não pie!"


Leandro Altheman

Até ontem, é verdade, estava me sentido como uma criança que vê o Brasil perder a Copa do Mundo. Tristeza igual só senti em 1982, quando vi a seleção de Zico, Sócrates e Falcão, perder para a Itália de Paolo Rossi*. Afinal, foi grande a preparação para aquela Copa da Espanha, e todos achávamos que o Brasil seria Tetra.

Mas nem a vitória do Corinthians sobre o Inter conseguiu me alegrar. Afinal, com uma canetada, o STF, comandado pelo ministro Gilmar Mendes, puseram por terra cinco anos de estudo na Faculdade de Jornalismo. Senti como uma fragorosa derrota em minha vida pessoal.

Nesta postagem, não vou abordar os aspectos políticos desta grande estupidez que fizeram. Ou talvez não tão estupidez assim, uma vez que favorece aos interesses que o ministro defende tão bem.

Fico apenas no aspecto pessoal. Eu, Leandro, uma pessoas cujos sonhos me trouxeram até estas distantes paragens. Quisera apenas eu, contribuir com este amado Acre, este amado Juruá. No entanto, recebi em troca, muito mais do que doei. O ar destas florestas alimentou a chama de uma esperança adormecida. Acho que jamais poderei pagar por isso. Mais do que o reconhecimento profissional que obtive nestas terras, inteirar-me das lutas e contradições de seu povo, fez-me sentir vivo, desperto, deu-me um sentido como nunca antes. Por tudo isso, sou grato desde aqueles que me deram oportunidade de trabalho até os mais humildes entrevistados: gente simples, das ruas, agricultores, donas-de-casa que alimentaram o oficio cotidiano de mostrar o Juruá ao Juruá.

Costumo dizer que a nossa profissão, embora técnica, em alguns momentos se aproxima da arte. Afinal, em tudo há uma mensagem, não apenas nos “press-release”, ou boletins de ocorrência, mas também no pôr-do-sol, no sorriso de uma criança, nas lágrimas de uma mãe. Decodificar estas mensagens é a parte artística que cabe ao Jornalista.

É verdade: não há faculdade capaz de fazer, por si só, despertar a sensibilidade artística e poética em cada jornalista. E sem a poesia, a notícia é apenas vida em preto e branco. A “informação pura”, não traz em si o sentido da vida, pois é o abstrato quem verdadeiramente nos move.

Já que a comparação com o Jornalismo é agora a culinária (uma arte a qual aprecio tremendamente) posso dizer que há poetas da cozinha, que unem o impensável para dar sabor ao imaginável. Mas há também aqueles que só sabem fazer o arroz com feijão (que também alimenta, engorda e faz crescer). Não é preciso faculdade para saber disso. Também não é preciso grande capacidade intelectual para saber quais são os interesses que movem o ministro a uma decisão desta.


Mas, como disse tão bem o monge: "nem sempre que tem põe na m... é teu inimigo!"


Pois o ofício cotidiano da notícia às vezes nos impede de enxergar este algo mais. De tentar novos sabores na notícia. A segurança de uma redação, embora desejável do ponto de vista trabalhista por vezes massacra o artista que existe em cada jornalista e acabamos preferindo o arroz com feijão.

Uma puxada de tapete destas pode ajudar a devolver ao Jornalismo, um dinamismo, que, mais na frente, irá comprometer os interesses que o ministro com ela defendeu. Livres, do medo e da falsa sensação de segurança iremos alçar vôos ainda maiores.

Coragem!Convido a todos para que combatamos nesta seara. Movidos por um código de ética,

como o "Bushi-Dô" dos Samurais, sem temer a morte ou a derrota, seremos livres, lancemos nosso grito, nosso uivo. Lancemos mão das novas armas, a Internet, os sites, os blogs, e um dia, veremos cair por terra o monopólio da informação e do pensamento.


“No alto da torre a Coruja tudo vê!”







"No alto da montanha Gavião Piá – Piô!”




* Na foto, Zico com a camisa rasgada por um zagueiro durante uma ofensiva na área adversária. Era Penalti, mas o Juiz não viu.

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