segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Onde o Vento faz a Curva

Parte I - Caçadores de votos

Lá estavam eles de novo, os caçadores de votos.  De quatro em quatro anos eles apareciam, como uma fruta temporã, ou uma revoada de aves migratórias, para desaparecer novamente nos anos seguintes. Desta vez, coincidência ou não, eles vinham exatamente atrás das máquinas que faziam a abertura de ruas. Ruas esquecidas durante os quatro anos anteriores. Naquele ano nem mesmo o barranco do rio tão incerto quanto improvável para uma rua, foi esquecido.

Um ano antes não faltariam desculpas para não fazê-lo: - o barranco está quebrando, não podemos fazer uma rua lá... É muita tabatinga... teremos que escavar o solo e o terreno não é firme.... É o mais provável que diria o secretário Meia-Sola com seu inseparável boné Nelore.

As coisas eram assim mesmo em Nova Constelação. A pequena colônia humana nos fins da galáxia já fora um importante entreposto de produção de árvores-de-leite. Essencial para as espaçonaves que cruzavam a galáxia de um ponto a outro. Mas finalmente os cientistas haviam aprendido a plantar as árvores-de-leite em cultivos controlados no cinturão de asteroides e Nova Constelação perdeu a sua importância. Passou a ser apenas um posto avançado da força intergalática a fim de impedir que o império tawantinsuiano avançasse sobre os sistemas da federação.

Mas na melhor das hipóteses, Nova Constelação não era nada mais do que um ponto esquecido da imensidão do espaço, o local onde os ventos de partículas estelares faziam a curva e regressavam para o centro galáctico.

Por esta razão, os cargos políticos eram disputados de todas as formas. As verbas federais que eram destinadas a manter o funcionalismo público, tão necessário quanto um secador de cabelos no deserto, eram praticamente a única fonte de renda em Nova Constelação.
Não haviam limites para conquistá-los.
Lembrava-me de oito anos atrás. Duas eleições anteriores.

- Ele vai trazer os melhores cantores da galáxia. Todos os jovens vão votar nele. Vou perder a eleição.       Dizia preocupada a candidata Zhélia Pantera, enquanto caminhava de um lado outro do salão.
- Faça a sua parte e deixe comigo o restante. Disse a confiante a sacerdotisa Assandrea, enquanto manuseava a pequena rosa-dos-ventos que trazia presa ao colar, símbolo de sua ordem.

Zhelia deveria mesmo ter feito altas promessas à sacerdotisa dos ventos, pois naquela semana em que aterrissariam em Nova Constelação os famosos cantores LBK’s,  uma nuvem de fumaça de partículas estelares cobriu os espaçoportos da região, impedindo o pouso da nave que traria os aristas e talvez mudasse o rumo das eleições. Agradecimentos especiais ao vento que trouxe as partículas e mudou o rumo das eleições.

Depois de vencidas as eleições, os prédios públicos tingiram-se de cor-de-rosa e alguns chegaram a dizer que seria parte do compromisso firmado com a sacerdotisa Assandrea que prometera  à Deusa-dos-Ventos pintar os prédios com a sua cor, o rosa.  

Quando o marido de Zhélia adoeceu disseram também que era o alto preço pago pelo uso indiscriminado da magia. No final a Deusa-dos-Ventos acabou tão abandonada quanto Nova Constelação e tornou-se um perigoso vento-sem-rumo aparecendo nos momentos mais inconvenientes.

Pouca gente lembrava disso quando um vento-sem-rumo inexplicavelmente arrancou somente a cobertura do ginásio de esportes deixando intactas todas as outras casas. Ia pelos ares a promessa de campanha de Valdir Lessa, o novo administrador de Nova Constelação.

Mais uma eleição se aproximava, e os esquecidos habitantes de Nova Constelação, lá onde o vento faz a curva a se sentiam mais uma vez felizes, com a percepção, temporária e ilusória, de quem mais uma vez haviam se tornado o centro do universo.

Quem permanecia esquecida era a Deusa-dos-Ventos. O candidato postulante ao cargo de administrador de Nova Constelação era um adorador do Deus-Pastor e seu filho, o Deus-Ovelha e tremia só de ouvir falar nestas coisas.
Mas não se convida uma tempestade para morar em casa e se esquece dela. Mais cedo ou mais tarde, a Deusa-dos-Ventos iria se mostrar, para que todos pudessem ver agitando suas saias ela faria os ventos mudarem mais uma vez de rumo, em Nova Constelação, lá onde o vento faz a curva.

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