sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Economizam no dinheiro, mas não no sangue



Familiares de policial assassinado têm direito à indenização por parte de empresário, afirma Major da PM

Em meio a bandeiras negras, comoção popular e uma ação espetacular das Polícias Civil e Militar, é de se esperar que passem despercebido aspectos digamos “secundários” da notícia em si, mas que de fato, podem estar na raiz dos problemas noticiados.
Tentativa de linchamento na chegada dos suspeitos. Imagens: Juruá On Line

O primeiro é a questão dos “bicos” realizados por policiais como segurança privada.

Durante a coletiva desta quarta-feira (08), tive a oportunidade de questionar o comando regional da PM sobre a prática, que além de ilegal, coloca em risco a vida de pessoas.
Meu primeiro questionamento foi sobre o recebimento de benefícios a que a família do policial assassinado teria direito em caso de morte em serviço.
Major Moura, Comandante da PM em Cruzeiro do Sul e região
O Comandante regional da PM no Juruá, Major Moura respondeu que os familiares receberiam os benefícios assegurados por lei.
Mas o fato é que a lei não assegura tais benefícios no caso de o policial ter morrido fora de serviço, ou nesse caso pior: prestando um serviço que é ilegal.
Major Negreiros complementou a informação, afirmando que os familiares têm direito a pedir na justiça, indenização ao empresário pela morte do PM.
Major Negreiros comanda as operações aéreas da PM no Acre
O segundo questionamento é com relação à própria exposição ao risco de morte durante o serviço de segurança privada pelos PMs, sem as devidas garantias.
Na opinião de Major Moura, a atuação dos PMs como seguranças privados, ainda que ilegal, seria um fator de segurança a mais, pois reforçaria a presença policial nas ruas da cidade.
Sobre este ponto, sou obrigado a respeitosamente discordar do comandante, e apresento meus argumentos, não com a autoridade de um especialista na área de segurança pública, mas como um ex-morador de uma das cidades mais violentas do mundo.
A atuação dos policiais como seguranças privados, tal qual está acontecendo em nossa cidade, tão somente os irá expor a um risco extremo de serem mortos.
No caso específico do Major M.Araújo, por ocasião do assalto, o mesmo encontrava-se na função de motorista. Armado e sozinho tornou-se um alvo com poucas chances de reação e menos ainda de evitar o assalto.
Sargento M.Araújo. Imagem: Ecos da Notícia
Não é segredo que em Cruzeiro do Sul, policiais militares sejam vistos em supermercados, às vezes atuando como guardadores de capacetes ou empacotadores de mercadoria.
Sua presença pode ter a eficácia de afastar algum “bêbado” ou “noiado” que deseje furtar uma lata de leite, mas não significa absolutamente nada para criminosos minimamente organizados. É apenas o primeiro alvo a ser eliminado ou neutralizado.
Em setembro de 2013, o sargento Cleiton Aquino morreu na função de segurança privado após ser baleado durante uma tentativa de assalto à loja City Lar em Rio Branco.
Por vezes, a mistura de funções como segurança pública e privada, ganha contornos ainda mais obscuros, como o caso recentemente noticiado na imprensa da capital em que policiais teriam praticado a extorsão o proprietário do Auto Posto Correntão, em Rio Branco , afirmando que o “serviço de inteligência” teria descoberto um assalto planejado para o estabelecimento. Após pagar durante meses o serviço de segurança privada a uma equipe formada exclusivamente por PMs, o empresário resolveu cancelar o serviço e denunciar a extorsão.  
É fato que nossa região não possuiu ainda um histórico de violência que suscite tais questionamentos, mas este histórico começa a mudar, e antes que mais vidas se percam, é importante atentar para estes fatos.
Cruzeiro do Sul dispõe hoje de pelo menos quatro empresas de segurança privada. Em conversa com um empresário do setor, o mesmo me confidenciou que o preparo de um policial militar, é de fato melhor que o de um segurança privado, mas que o PM não tem garantias legais no caso de ser baleado, ou se por ventura, matar o assaltante.
Podemos dizer que por trás de um crime, há pelo menos outros dois: o exercício ilegal da profissão de segurança privado, com evidentes riscos à vida humana e a complacência do comando da PM com a prática ilegal.
Da parte do empresariado percebe-se também uma prática que apesar de não poder ser classificada como ilegal, é pelo menos, imoral: colocar pessoas em situação de risco de morte em defesa de seu patrimônio privado, sem as garantias legais que tal exercício exigiria.
Em poucas palavras: economizam no dinheiro, mas não no sangue. Do outro, é claro.

* O segundo aspecto "secundário" diz respeito justamente ao trabalho da imprensa, e farei um post sobre isso mais adiante

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