quarta-feira, 27 de abril de 2016

A República de Temer

Uma análise bastante comum entre historiadores sobre a proclamação da república é a de que não houve participação popular.
Nesse sentido, o quadro de Benedito Calixto traz um registro importante, não tanto pelo que retrata, mas pela ausência que revela.
O historiador José Murilo de Carvalho refere-se a esta ausência do povo como o ‘pecado original’ da República. Dele originam-se todos os outros.
Ali estão os militares e fazendeiros cafeicultores, estes últimos, particularmente decepcionados com o Império que havia acabado com a escravidão, havia pouco mais de um ano.
Quem está na foto na República de Temer?
Eduardo Cunha, e seu congresso-circo, as oligarquias das poucas famílias que comandam a imprensa nacional, a FIESP e seu pato, os ruralistas e suas mãos sujas de sangue indígena, os teocratas fariseus, os neo-fascistas.
Mas, e o povo? Afinal o povo nas ruas teve um papel primordial para forçar a votação favorável ao impeachmeant no congresso. O povo fará parte desta República de Temer?
Ou repetirá as palavras de Cazuza quando cantou “Não me convidaram para esta festa pobre que os homens armaram para me convencer”.
Segundo a pesquisa IBOPE, Temer possui pífios 8% de preferência do eleitorado enquanto 62% dos entrevistados pedem novas eleições. Definitivamente, o povo não está na foto.
Assim como na República proclamada por Deodoro, a Nova Velha República de Temer também não precisa do povo para existir.
Os fundadores da República de Temer estão certos de que havendo legalidade, a legitimidade é supérflua.
Já empalidece o verde amarelo do “povo nas ruas”, desconvidado a participar da patriótica cruzada contra a corrupção.
Talvez por isso, o super-herói da vez, Sergio Moro tenha subitamente, desaparecido das manchetes. Talvez, quem sabe, a Lava Jato continue acontecendo, mas agora sem os holofotes da imprensa, como sabê-lo?
Sem os vazamentos seletivos, as delações premiadas, as citações comprometedoras, as propinas e doações de campanha passam a fazer parte de outro jogo, outro tabuleiro, onde jogarão agora PMDB e PSDB, como peças de barganha interna.
Um cargo, um ministério, a aprovação de uma lei, o esquecimento/arquivamento de um processo contra um adversário ou aliado.
Temer, o ‘capitão do golpe’ nas palavras de Ciro Gomes, por seu turno, provoca as mais incontidas gargalhadas ao referir-se agora ele, como ‘golpe’ a iniciativa que começa a ganhar corpo no senado, da convocação de novas eleições.
Cunha, o ungido, aquele das contas no exterior e da lavagem de dinheiro ilegal de campanha através de uma igreja, tem tudo para ser inocentado no conselho de ética, mas pode vir também a ser sacrificado, caso a República de Temer assim julgue necessário. Há muito mais a ser protegido. A lista da Odebreacht vai longe e certamente, não existe honra entre ladrões.
Bordões como “Fora e PT” e “Pelo fim da corrupção” darão vez a outros: “Tudo pela Governabilidade”, “União pelo Brasil”, “Tirar o Pais da Crise” e etc.
O espetáculo, senhores, não terminou, apenas as cortinas foram cerradas para disputas que agora serão travadas nos bastidores.
O povo nas ruas?
Não precisam mais. Podem se sentar em suas poltronas confortáveis e voltar a assistir seus seriados de TV favoritos.
Leandro Altheman
Publicado originalmente no site de notícias Juruá em Tempo