quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Embiaras, a batalha dos séculos, tracajás em desova e outras historietas

Embiaras

Para quem já acompanha o blog Terranáuas há algum tempo, também já deve estar acostumado às suas ‘embiaras’.
Acontece que o blog foi criado especialmente para tratar de temas mais ligados às questões indígenas, ambientais e espiritualidade. Mas como realmente não há como fugir temas políticos, acabei criando a coluna ‘embiaras’. O próprio nome reflete um preconceito meu de que a política seria um tema menor, algo de menor importância e que não enche barriga. Isso porque embiara, para quem não sabe, significa caça pequena.
Minha própria concepção sobre a política ser algo menor, mudou, mas resolvi manter o nome porque gosto dele: embiara.
Isso porque já passei décadas de minha vida dizendo ‘OM’ pra tudo e se isso, por um lado me ajudou a não perder o eixo, por outro, não mudou nada a realidade à minha volta. Não há como fazer belos vasos de cerâmica sem sujar as mãos de barro, e o barro meus caros, é a realidade. Em seu livro, Tawantinsuyu, o Xamã Alonso Del Rio, explica, que na cosmovisão andina, não há como professar uma espiritualidade verdadeira sem antes desenvolver um profundo senso de amor pela realidade.
Assim sendo, a ‘isenção’ só existe como condição ideal, porém nunca real do ser humano. Sempre estaremos em maior ou menor grau, envolvidos nas questões que nos cercam, como sujeitos políticos. Há aquela velha máxima de que mesmo quando escolhemos ser apolíticos, esta escolha é política.
Portanto, vou deixar os falsos pudores de lado e ‘sujar as mãos de barro’ na realidade. Quem sabe ainda faço uns vasos bonitos.

Caçadores, à caça!

A batalha dos séculos

Não senhores. Esta não será uma disputa entre esquerda e direita, ou entre pobres e ricos. A eleição municipal deste ano em Cruzeiro do Sul será para escolher se a cidade entra para o século XXI ou permanece presa a mesmo coronelismo de tonalidades feudais do século XIX.

Carla não restringe seu eleitorado somente entre os tradicionais apoiadores da FPA no Juruá. Tanto que tem igualmente admiradores no campo da direita, em setores que sempre foram críticos ao PT e à FPA.

Primeiro, porque Carla transmite a segurança de quem, se for dada a oportunidade, irá gerir a coisa pública com a responsabilidade e transparência que tanto fazem falta na administração municipal.

Segundo, porque a delegada está muito, mas muito longe dos estereótipos dos militantes de esquerda, com suas frases feitas, seus bordões ultrapassados, e seu sectarismo.

Ainda assim, um olhar atento vê nela sim, uma política identificada com a esquerda. Não numa camisa vermelha, ou num punho cerrado, mas no olhar atencioso, no sentimento da importância da dignidade humana.


Escolher Carla Brito significa que escolher o novo, a modernidade. Significa escolher dizer que a política deve ser gerida por interesses públicos e não familiares. Escolher o mérito e não o nome.  A coisa pública, e não a ‘cosa nostra’.

Não sou guru ou vidente, para fazer previsões astrológicas sobre o resultado das eleições. Baseado nas conjecturas políticas de pretensos 'especialistas' o mais acertado seria dizer que o povo vai quer sempre 'mais do mesmo'. 

Quero pensar que não, e que o desejo de mudança possa ser traduzido na forma do voto em Carla Brito.

O meu voto, está definido em Carla Brito e nunca antes, em uma eleição municipal, terei dado um voto com tamanha convicção.

Fica o leitor portanto sabedor de minha própria posição política, o que considero mais honesto do que escamotear minha opinião por trás de uma falsa isenção.

Dito isso, vamos portanto à análise

Esta será minha quarta eleição municipal da qual participo em Cruzeiro do Sul. Cheguei na cidade do ano de 2000, as vésperas da eleição que deu a César Messias a prefeitura da cidade. Depois disso tivemos: Henrique (PT) X  Zila (PTB). Zinho (PP) X Vagner (PMDB) e novamente Henrique (PV) X Vagner. 

Como todos sabemos, em nenhuma dessas ocasiões a FPA conseguiu eleger o seu candidato. Ainda que sempre mantivesse uma pequena margem de diferença em relação ao vitorioso. Um destaque para Henrique Afonso em 2012, que definitivamente, venceu Vagner Sales na área urbana da cidade.

Henrique crê, e com acertada dose de razão, que é um bom nome para a disputa da prefeitura de Cruzeiro do Sul, mas que sua aproximação com a FPA foi o fator decisivo para sua derrota. Nunca faltou gente para dizer 'gosto do Henrique, mas ele é do PT' (mesmo quando ele disputou pelo PV), assim como não faltará gente para dizer 'gosto da Carla, mas ela é do PT, mesmo que ela seja do PSB, partido que fez oposição à Dilma e faz parte da base de apoio ao governo Temer.

Esse tipo de eleitor, que 'gosta do candidato fulano, mas não vota porque ele é do PT' é um 'brincante': sempre vai votar nos candidatos indicados dentro da mesma estrutura patriarcal-coronelista que domina a cidade. 

Há um eleitor 'cativo' que vota na FPA, ou por afinidade com o modelo, ou por rejeição às figuras políticas locais, normalmente pactuadas com feudos familiares e aos setores a quem mais interessa o atraso social e a dependência econômica da população.

De modo antagônico, outra parcela da população, sempre viu no voto dos candidatos de oposição ao governo, uma forma silenciosa de resistência, seja às vontades da corte riobranquense seja ao vermelho do PT. Por essa lógica, os candidatos de oposição ao governo, depois de eleitos, nunca precisaram fazer muita coisa para viabilizar-se politicamente. Bastava, é claro, continuar na oposição ao governo. Quanto mais xucra e anedótica possível essa oposição, melhor, mesmo que isso custe um atraso de mais de uma década no desenvolvimento da cidade. 

E o que há de diferente nessa eleição, ou mais especificamente, na candidatura de Carla Brito?

Tracajás

A ironia é que a 'forasteira' Carla Brito é justamente a mais 'cruzeirense' das candidaturas. Carla está totalmente apoiada em um trabalho realizado em Cruzeiro do Sul. Não em Brasília ou Rio Branco. Por aqui o que não faltam são os 'cruzeirenses' que passam anos fora, montam suas vidas em outras cidades e como os tracajás que não moram na praia, voltam nela na época de 'botar os ovos'.

Pela primeira vez, temos uma candidatura que se articula por afinidades de princípios e não por determinações de caciques. É por isso que não estranha, por exemplo, que Carla, 'uma mulher da lei' possa encontrar apoios tanto entre militantes de esquerda, quanto entre aqueles normalmente mais conservadores e identificados com a direita. O primeiro anseio é de que o candidato seja comprometido com a transparência, com a ética na política. Carla satisfaz esse anseio do eleitor e por isso tem sido capaz de agregar pessoas para além dos 33%, 'cativos' da FPA. 

Carla já é um fenômeno e a pesquisa fajuta do PMDB que a coloca com 11%, antes mesmo de ser lançada, é somente mais uma prova disso. 

O que mais impressiona é a capacidade de Carla agregar pessoas das mais diversas, de trazer de volta o interesse político para um tipo de eleitor que sempre via nas eleições, 'mais do mesmo'.

Química

Nas próximas semanas, Carla deverá iniciar o processo de consulta pública para o Plano de Governo. 

Sim, isso mesmo, Carla, a 'forasteira' respeita a vontade dos cruzeirenses e vai ouvir a nós todos, antes de registrar o seu plano de governo. Você foi ouvido no plano dos demais candidatos?    

Nesse processo, poderemos mensurar como será a química Carla + Povo. 

Sendo também eu um 'forasteiro' com dezesseis anos de Juruá, eu aposto, que a Pernambucana de Petrolina consegue se identificar, falar e sobretudo, ouvir a linguagem do povo, bem mais do que alguns tracajás que desovam nessas praias a cada quatro anos.

Digo isso imitando para mim mesmo um sotaque pernambucano e ouço, lá no Cais do Porto, uma resposta em alto e bom 'acreanês':


- Má vai mermo!