quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Mais Escolas ou Mais Presídios

Não é de hoje que setores da imprensa semeiam na opinião pública a ideia de que jovens que cometem crimes entre 16 e 18 anos deveriam pagar na mesma moeda que os adultos.
A princípio a ideia de que um jovem de 16 anos que mata, rouba ou trafica já é capaz responder pelos seus atos parece bastante simples e até certa medida, justa.
Contudo, é preciso analisar a questão um pouco mais a fundo para tentar compreender o que significaria uma redução da maioridade penal.
A grosso modo seria responder que jovens entre 16 e 18 anos que hoje cumprem medidas sócio-educativas iriam, obrigatoriamente para uma prisão comum.
Acredito que o microcosmo de Cruzeiro do Sul, nos fornece dados interessantes sobre a situação da nossa juventude e o que significaria a sua criminalização.

Alguns dados

No Instituto Sócio –Educativo (ISE) cumprem medida sócio-educativa hoje, 56 adolescentes entre 12 a 18 anos.
Destes 56, 27 deles praticaram roubo de pequenos objetos e outros 8, furto. Na maioria deles trata-se de roubo de celulares
Segundo a assistência social e psicológica da unidade, todos estes crimes estão relacionados à dependência química, ou seja: furtos e roubos para manutenção do vício.
Ainda segundo a unidade, são estes menores infratores que apresentam o maior índice de reincidência, isto porque, enquanto não for sanada a questão da dependência química, é certo que virão a ser praticados novamente os mesmos crimes.

Crimes Hediondos

Uma proposta aparente mais moderada prevê a redução de maioridade penal para quem cometer crimes hediondos.
No ISE de Cruzeiro do Sul, entre os 56 adolescentes, há apenas 4 casos de homicídio. Dois simples e dois qualificados.
A direção da unidade explicou que não há motivação específica para o homicídio e muito ao menos premeditação. Em todos os casos, o menor teria agido sob forte emoção e por uma fatalidade, encontrado em seu alcance uma arma.
O mais surpreendente contudo, é que no caso de homicídios praticados por menores, o índice de reincidência é próximo a zero. Ou seja, são justamente os menores que cometem homicídios os que apresentam o melhor índice de recuperação.
O que significaria colocar estes jovens “atrás da grades”?
Em prisões comuns, quais seriam as chances de ressocialização destes jovens e quais as chances de se tornarem “mestres do crime”?

Tráfico de Drogas

É importante lembrar que no Brasil, tráfico de drogas é qualificado como crime hediondo, o que significaria, prender jovens de 16 anos com envolvimento no tráfico. Sabe aquele garto que “vende uma parada” às vezes para sustentar o próprio vício, ou porque simplesmente não teve outra chance? Pois sim, pela proposta de redução da maioridade penal para crimes hediondos, este jovem iria para a prisão, com chances mínimas de reabilitação.

Impunidade

A ideia popularizada pela imprensa de que o jovem infrator não é responsabilizado pelos seus atos, não corresponde à realidade. 
O ECA prevê as chamadas medidas sócio educativas que podem variar desde uma simples advertência, passando pela reparação do dano e prestação de serviços comunitários até a internação por até três anos.
Apresentadores de programas policiais nas TV afirmam, faltam com a verdade ao afirmar que um jovem que comete um crime grave aos 17 anos, é solto imediatamente ao cumprir 18 anos. 
Isso não é verdade. 
O jovem pode passar até os 21 anos em medida privativa de liberdade. Caso cometa um crime, dentro da unidade, já com mais de 18 anos, também irá responder como adulto.

Superlotação


A Unidade Penitenciária de Cruzeiro do Sul atualmente conta com um efetivo carcerário de 550 presos, sendo que dispõe de 224 vagas, ou seja  um défit 326 vagas. Atualmente as celas que foram planejadas para 2 presos, abrigam uma média de 5 presos.

Com esse problema de superlotação, são inevitáveis surgirem problemas de ordem estrutural, elétrico e na rede de esgoto, pois um prédio planejado para determinado número de usuários, sendo dobrado essa lotação, o que se foi projetado não suporta.
Com uma redução na maioridade penal haveria o agravamento da superlotação já existente.

Não seriam apenas 56 jovens a mais na penal. Teriam de ser incluídos aqueles que hoje cumprem medida no CREAS, ou seja, em liberdade.


Mais Escola

Uma análise nos dados do ISE de Cruzeiro do Sul também aponta que a solução pode não ser o encarceramento da juventude, mas a sua escolarização.
70% dos jovens que cumprem medida no ISE, não chegaram a concluir o ensino fundamental. Alguns deles, jovens de 17 anos estão se alfabetizando somente agora, durante cumprimento de medida restritiva de liberdade.
O custo de manutenção de um jovem no ISE é próximo de 2 mil reais.
Segundo dados publicados em matéria do jornal “O Globo”, um preso chega a custar 21 mil reais para o estado brasileiro, nove vezes o que é gasto com um estudante.
Na outra ponta estão aqueles que defendem o ensino em tempo integral como forma de ampliar o acesso à educação, cultura, lazer e esporte, e consequentemente, uma diminuição da criminalidade entre os jovens.
Certamente que os investimentos para viabilizar o ensino integral em caráter universal para nossa juventude demandariam grandes somas em dinheiro, mas ainda seriam menores do que as somas exigidas para o encarceramento desta mesma juventude.

Uma análise fria da situação nos permite afirmar com boa dose de assertividade que a redução da maioridade penal além de fazer parte de um ideário ultrapassado, é sobretudo, uma medida cara e ineficaz de combate à criminalidade. 

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